Avenida Paulista, São Paulo / Reprodução
Foi disponibilizado ao debate interno do PT de São Paulo recentemente o texto intitulado “Diretrizes e ideias para um plano de recuperação e transformação do Estado de São Paulo”, de responsabilidade do Núcleo Estadual de Acompanhamento de Políticas Públicas de São Paulo – NEPP/SP, vinculado à Fundação Perseu Abramo – FPA. O texto é uma contribuição preliminar, não tem caráter oficial e, portanto, não vincula a ação partidária.
O NEPP é um projeto recém-nascido e seu objetivo é o de se dedicar a estudar e debater a realidade paulista de forma permanente e sistemática, oferecendo subsídios ao PT e ao campo democrático em geral para a elaboração de políticas públicas voltadas ao desenvolvimento econômico, social e sustentável do estado. Trata-se de uma iniciativa inédita e, em larga medida, inovadora, pois vem a preencher uma lacuna que não se restringe ao PT, mas diz respeito também aos demais partidos e à própria mídia em geral, que é a de se dedicar quase plenamente suas análises e críticas à realidade nacional, reservando espaço marginal para a realidade do território estadual.
Aceitaram compor esse projeto uma centena de colaboradores e colaboradoras: pesquisadores acadêmicos, profissionais com especialidades diversas, dirigentes e ativistas de movimentos sociais e, por fim, ex detentores e detentoras de mandatos municipais pelo PT. Uma parcela significativa desse conjunto não é filiada ao PT ou exerce militância partidária ativa. Graças ao comprometimento de todos e todas, o resultado foi bastante satisfatório, pois se produziu, com liberdade e sem qualquer tipo de cerceamento, um alentado conjunto de ideias e diretrizes para se governar São Paulo numa perspectiva progressista.
O texto em questão não tratou de políticas setoriais especificamente e sim de eixos estruturantes, que conformam os desafios formidáveis a serem enfrentados no estado que detém o maior PIB da federação. Alguns desses desafios são lembrados aqui, sem preocupação com ordem hierárquica de importância. O reconhecimento de que São Paulo é um estado que abriga realidades sociais, econômicas, culturais e territoriais distintas e que requerem políticas adequadas para essa circunstância. O reconhecimento de que o exercício de governar o estado enfrenta dificuldades, em razão do desmantelamento de sua estrutura pública de planejamento: em que condições isso pode ser recuperado ou atenuado? O enfrentamento das desigualdades, no plural: econômica; racial; de gênero; de orientação sexual e a explicitação da discriminação de classe contra os pobres; e a afirmação de uma política de direitos. O enfrentamento do desemprego e da queda da renda das famílias de trabalhadores e do recrudescimento da fome, da miséria e da violência, circunstâncias agravadas dramaticamente pela pandemia. O enfrentamento das mudanças climáticas, a exigir diretrizes para a transição ecológica: descarbonizar a economia paulista. A defesa da democracia e os seus desdobramentos na perspectiva da participação social na governança compartilhada, em consonância com a gestão interfederativa republicana, participativa, solidária e efetiva das políticas públicas nos distintos territórios do estado, particularmente os que conformam as nove regiões metropolitanas hoje existentes. Uma economia que enfrente e equacione o processo de esvaziamento industrial em curso, impulsione as micro e pequenas empresas e viabilize o desenvolvimento da economia solidária. O fortalecimento das instituições voltadas à ciência, à tecnologia e à inovação, sem o que é impossível fortalecer a economia paulista. O processo educativo e cultural e a formação da mão de obra na era digital: universalizar o acesso às tecnologias digitais. O enfrentamento da informalidade e precariedade que contaminou o mundo do trabalho, levando os jovens ao desalento e à perda de perspectivas. O enfrentamento da situação da sociedade que envelhece e traz implicações econômicas e sociais com o fim da janela demográfica. O resgate e a afirmação de um sistema único de saúde verdadeiramente universal e público. E por aí vai.
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Por fim, cabe um comentário sobre o caráter crítico às gestões do PSDB no estado ao longo de quase três décadas trazido pelo texto e que tem causado perplexidade em alguns círculos, em razão das articulações para Alckmin vir a compor chapa com Lula nas eleições presidenciais do corrente ano. É necessário afirmar taxativamente, desde logo, que não seria honesto e transparente, na verdade um oportunismo inaceitável, sobretudo da parte de uma entidade prestigiosa como a FPA, dedicada ao pensamento crítico e à formulação estratégica, negar que o PT sempre se colocou como oposição sistemática às gestões do PSDB em São Paulo. Por outro lado, é igualmente necessário asseverar que essa oposição se deu dentro das regras do jogo democrático, tanto nas pugnas das ruas e do parlamento, quanto nas disputas eleitorais. E que as divergências não impediram que o PT, diante dos riscos de retorno do malufismo, apoiasse decididamente a chapa Mário Covas/Geraldo Alckmin no segundo turno das eleições ao governo do estado em 1998. E não têm impedido apoio do PT a projetos de interesse da população na Assembleia Legislativa.
Quando o pacto democrático estabelecido pela Constituição cidadã de 1988 está sob ameaça real e anuvia-se o futuro da Nação, com o desmantelamento das instituições e das políticas públicas, ora em curso, é absolutamente imperativo que diferenças programáticas e mesmo ideológicas sejam generosamente relativizadas e cedam lugar, através do diálogo, a um objetivo maior, que é a defesa da civilização contra a barbárie e o vislumbre da reconstrução do país. Geraldo Alckmin como companheiro de chapa de Lula se insere nesse contexto.
Eleonora Menicucci de Oliveira, foi Ministra da Secretaria de Políticas para as Mulheres.
José Machado, foi Prefeito de Piracicaba/SP e Deputado Federal.
Newton Lima, foi Prefeito de São Carlos/SP e Deputado Federal.
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